Mais escravos na Marinha

Ao saber que um preto, acusado de “perseguir a alforria dos pretos de Santarém, seria solto pelo Ouvidor Geral por falta de provas, a junta, em dezembro de 1822, lhe determina que remeta o preto para o intendente da Marinha “para lhe mandar assentar praça de pedestre”.

(Códice 629, Arquivo Público do Pará)

A revolta de Angelim

Reproduzo abaixo expediente inédito que Eduardo Angelim dirigiu ao general Manuel Jorge Rodrigues em 25 de janeiro de 1836, publicado no Jornal “O Paquete do Rio”, do Rio de Janeiro, nº 101, de 6 de maio de 1836, página 1.

É um documento que poderia ser escrito hoje, com a mesma motivação: um Pará mal conhecido, maltratado e manipulado pelo poder central, num centralismo federativo que só o admite na condição subalterna, explorada, colonial.

Um documento de grande importância, remetido com a generosidade de sempre de Ricardo Condurú, cujo blog, Cabanagem Redescoberta, é a melhor fonte documental sobre a revolta popular, que completou, entre ontem e hoje, 188 anos.

Será que antes do bicentenário sairá uma nova edição da Universidade federal do Pará dos Motins Políticos, de Domingos Raiol, cuja 2ª edição, da UFPA, tem 52 anos.

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Notícias do Pará

Ilmo e Exmo. Sr. – Todos os povos têm direito a pugnar pela sua liberdade, e firme neste princípio os paraenses têm obrado presentemente. Sim, o infeliz Pará que de nada lhe serviu emancipar-se, visto que nunca entrou na partilha com as mais províncias do Brasil, que mais ou menos receberam do governo bons presidentes e melhores empregados, sofreu por não poucos anos o tirano jugo e predomínio dos portugueses, sendo a sorte de seus melhores filhos a morte, a prisão, o extermínio. E por quê? Porque corajosamente se patenteiam defendendo os seus direitos legais! Que esperava, pois, o governo central, de um povo que só experimentava atos de tirania, lhanamente curvava seu colo para sofrer a opressão? O desespero. Sim, o desespero, enfim, ocupou os corações paraenses: a lei tantas vezes ultrajada ganha equilíbrio no dia 7 de janeiro de 1834 [1835]; o povo paraense toma as armas e derruba os monstros da perfídia; triunfa, enfim, e começa a gozar dos efeitos da doce liberdade. Mas, ah! Que pasmo se não apresentou ao mundo civilizado na conservação da ordem e boa harmonia entre o povo no mesmo dia da tormenta! Porém, de que serve a bonomia dos paraenses na obediência do governo central, quando o mesmo governo central capricha em levá-los a última desesperação!!! Infeliz Pará!!! quando se esperava o governo entrando nos seus deveres emendando a mão, que por tantas vezes tinha errado, curasse nossas feridas esquecendo o passado, convencido de que os paraenses operavam justamente provocados, nos enviasse um hábil médico político que fizesse o nosso bem ser; foi quando nos vimos em maior risco com a posse de V. Exa. As ruas da capital se coalharam de patrulhas compostas dos maiores inimigos da pátria; o lado de V. Exa. ocupou o mais detestando chumbeiro do Pará; os melhores brasileiros foram espancados, feridos e arrastados para os porões das embarcações entre apupadas e injúrias; finalmente expirou inteiramente a constituição, esse ídolo sagrado a quem os paraenses consagram cordial amor!!! Que faria, pois, um povo já conhecedor de seus direitos políticos? Lançaram mão das armas, e deu a V. Exa. decididas provas de valor, coragem e firmeza de caráter; V. Exa. desamparou a capital, e nós a ocupamos: como, pois, consentiremos a V. Exa. de novo entronizado na nossa pátria? V. Exa. virá sobre nós com desmarcada força, e menos não é de esperar de um governo bárbaro, que para os paraenses só têm grilhões e algemas, quando para os demais têm doces anistias; mas muito se enganam: os paraenses têm estado até hoje obedientes ao seu jovem e inocente monarca brasileiro nato, o Senhor Dom Pedro Segundo, e dele esperam o bem-estar de sua pátria; porém, quando suceda o contrário, verá o mundo o Pará reduzido a cinzas, e dele se dirá o mesmo que disse o poeta dos campos onde foi Tróia (*); pois os paraenses protestam largar a capital depois de terem tocado fogo nos principais edifícios já providos de combustíveis, materiais para isso aparelhados. Não queira, pois, V. Exa. acabar por desgraçar a melhor porção do Império do Brasil, como já principiou a fazê-lo; meta a mão na sua consciência, e conheça quantos males nos trouxe, quantas vítimas imolou a caprichos extravagantes por diferentes pontos, morrendo a fome e a miséria devido tudo a V. Exa. no Pará, pois não consta que antes disso tal lhe sucedesse. Eu faltaria aos deveres sagrados de humanidade e amor da pátria se deixasse de fazer esta ponderação a V. Exa., responsabilizando-o desde já perante Deus, perante o governo geral, e perante o mundo inteiro pelos novos males que pesarem sobre o Pará, pois os meus desvelos o vão reduzindo a total sossego como preparando-o para o restabelecimento da lei.

Deus guarde a V. Exa., Palácio do Governo do Pará, 25 de janeiro de 1836. Ilmo. e Exmo. Sr. Manuel Jorge Rodrigues. – Eduardo Francisco Nogueira Angelim.

(*) É possível que Angelim esteja se referindo a obra “Eneida”, de Virgílio (Nota do Blog Cabanagem Redescoberta).

Escravo agride

Em 11 de julho de 1822, a junta se refere ao ataque de um escravo de José Barbosa, em Cametá, contra o miliciano André de Souza, “que por ter feito os seus deveres no ato de andar rondando nessa vila com a nota de 16 de junho passado, foi insultado e maltratado com pancadas” pelo escravo.

(Códice 629, Arquivo Público do Pará)