Documentos ingleses (3)

Este é um dos documentos mais importantes que existe sobre a cabanagem. É o relato do comandante de uma esquadra da marinha inglesa, a mais poderosa do mundo na época, o capitão Cockburn. Ele viu os combates em um dos seus momentos mais ferozes. Desceu em terra e percorreu a destroçada capital do Pará. Conversou com Eduardo Angelim, o terceiro e último presidente cabano. Exigiu tomar satisfações pela pilhagem do navio mercantil inglês Clio e a execução d toda a sua tripulação, salvando-se apenas o grumete Alexandre Paton, que conseguiu fugir.

Cockburn ironiza o receio da esquadra brasileira de atacar e ocupar Belçém e o medo de Eduardo, que era apenas um rapaz. Elogia o líder cabano, por sua determinação e gentileza. Garante que, com sua tropa, se necessário, poderia enfrentar os rebeldes, que não iam além de 150 homens armados em Belém. Faz observações profissionais sobre o que viu.

Para facilitar a leitura, dividi o texto em mais períodos, corrigi alguns erros gráficos e de tradução e grifei os trechos que considero mais importantes.

Segue-se o precioso documento, tão pouco utilizado até agora.

SEGUNDO ANEXO

De:    Capitão Charles B. Strong, Navio de Sua Majestade Belvidera

Para: Cockburn

Navio de Sua Majestade Belvidera, sem data

Senhor,

Pelo Capitão Bennett do Rainbow, que chegou a Barbados no dia 9 de fevereiro de 1836, tive a honra de receber sua carta datada de 24 de janeiro e, como o Savage era esperado da Jamaica, onde havia ido com a mala postal, achei melhor aguardar por ele, tendo sido o seu calado tão bem calculado para o serviço que estávamos prestes a executar; então assim que aquele navio surgiu no horizonte, que foi no dia 13 de fevereiro,  levantei ferros com o Snake, desejando que o Capitão Bennett abastecesse o Savage com água e provisões para enviá-lo atrás de nós e o navio; pelo grande empenho do Tenente Loney, juntou-se a nós naquela tarde, quando zarpamos todos para a entrada do Rio Pará, chegando à ilha de Salinas no dia 9 de março, após uma longa travessia motivada por fortes ventos e correnteza, esta última nos atrasando alguns dias, em média, cinquenta e sete milhas nas vinte e quatro horas.

Eu sabia bastante bem que não deveria haver nenhum prático, mas, sob o pretexto de fundear para conseguir um, enviei de cada navio, um barco tripulado e armado, com a bandeira branca, sob o comando do Tenente Wood, o primeiro tenente, com instruções para que, se John Priest descesse e houvesse uma chance dos barcos saírem, o colocassem à força em um dos barcos, mas, de maneira alguma, atracassem.

Entretanto, ele não estava na ilha e não havia nenhum prático, o vento soprava forte quando os barcos deixaram o navio à uma hora, e a arrebentação e as ondas aumentaram tão rapidamente que não puderam sair de novo até às 2 horas do dia seguinte, quando todos saíram seguros para os navios. O Sr. Wood reportou que cerca de quarenta homens armados apareceram em terra, além de outros que eles provavelmente ocultaram.

A esquadra levantou ferros ao raiar do dia 11 em direção às águas rasas de Bragança e St. John, que formam o canal para o Rio e, apesar do tempo cerrado e tempestuoso, o Comandante, Mr. Tonkin, conduziu os navios, ancorando-os com segurança às 7 horas da noite ao largo da Ponta do Taipu, a 6 braças, onde fundeamos durante a noite e zarpamos no dia seguinte quando a maré se mostrou favorável.

Naquela noite às 9 horas, fundeamos na Bahia de Santo Antônio, onde encontramos o Campista com a bandeira do Presidente e também a bandeira do Contra Almirante; a Defensora, uma boa escuna; e, mais rio acima, o Regeneration.  Isso me permitiu, ao embarcar no navio do Almirante e prestar minha homenagem ao presidente e àquele oficial, a primeira oportunidade de tomar um certo grau de conhecimento sobre o estado das coisas no Pará e onde estávamos ancorados, mas todas as notícias eram contraditórias, os brasileiros diziam que tudo estava bem com eles, enquanto outros diziam que não havia a mínima chance de tomar a cidade e que não ousavam atacá-la;  entretanto, eu não nada tinha nenhum envolvimento com isso mas, a quando do meu retorno a bordo, escrevi a carta no.1 à Sua Excelência, o Presidente, cuja resposta recebi somente após dois dias, embora o tempo fosse da maior importância e, quando a resposta à minha carta efetivamente chegou, não estava traduzida. De fato, tudo indicava que eles queriam me atrasar, isso foi no dia 16, e o Comandante do Belvidera me informou que, se não saíssemos do rio antes do dia 27, teríamos que esperar mais 14 dias pela maré.

Durante esse intervalo eu disse repetidamente ao Almirante que, na execução de minhas ordens, eu tinha motivos urgentes para ir ao Pará com a esquadra para que eu pudesse fazer semelhantes demandas ao Eduardo diante de sua artilharia, sendo ele o presidente de fato e tendo a capital sob seu domínio, como também o povo de Salinas estava sob o seu comando quando o desastroso caso do Clio ocorreu, e que ele deveria ser responsabilizado pela conduta deles, embora ele tenha dado plena satisfação no âmbito de sua capacidade.

O Almirante Brasileiro me informou que o Pará estava  sob  bloqueio e que ele não acreditava que o presidente deixasse a esquadra  subir o rio, mas que ele lhe mencionaria isso.  Fui então obrigado a dizer ao Almirante, achando ele uma pessoa das mais capazes, que eu deveria subir, pois os crimes pelos quais eu havia vindo solicitar reparação eram da pior natureza e destes que todas as nações puniriam com o maior rigor da lei e que nós éramos amigos dos brasileiros e inimigos de quaisquer desordens, particularmente como as que ocorreram no Pará, em Salinas e em outros lugares; de fato eu usei de todos os argumentos para convencer o Almirante (da Cunha?) de que eu não cumpriria com o meu dever, ao meu Rei e ao meu país, se deixasse de fazer tudo para levar aqueles assassinos à justiça e que subiria o rio para a cidade, quaisquer que fossem as consequências, acreditando que estava fazendo o que era certo, mas descobrindo agora que todos os argumentos eram em vão e que, evidentemente, eles estavam nos retardando por alguma razão.

Na tarde do dia 16, enviei o Comandante Warren com uma mensagem verbal, ou aviso, ao presidente, informando-o de que eu zarparia na manhã seguinte às sete horas rumo ao Para.  O Comandante Warren retornou com as cartas de números 2 e 3, escritas em português e não traduzidas.  Eu sabia, entretanto, que uma delas continha um enérgico protesto contra a nossa ida, mas, já tendo decidido e estando totalmente convencido de que esta esquadra não teria feito tudo o que precisava, se não tivesse se mostrado a Eduardo, diante de sua artilharia, a esquadra levantou  ferros, portanto, na hora mencionada acima (os navios todos prontos para ação mas sem qualquer demonstração aparente) e, para evitar qualquer mal entendido com o povo da cidade do Pará que, no meu entender, estava em estado de grande agitação e desordem, eu hasteei uma bandeira branca e, após viajar mais dez ou doze milhas rio acima, o navio fundeou às 10 horas da manhã em frente à cidade, a quatro braças e meia de profundidade, distante dela cerca de quatrocentas jardas.

Nenhum tempo foi perdido e, às 11 horas, enviei o primeiro tenente Wood com minha carta no 4 ao presidente, Eduardo, que ocupava o palácio, solicitando uma resposta sem demora.  O tenente Wood, no seu retorno, me informou que minha carta havia sido lida através de um intérprete, na presença de grande número de pessoas que, quando chegaram à parte onde era exigida uma satisfação, vociferaram: ele quer satisfação, dê-lha a ele com pólvora e bala. Eduardo, entretanto, reprovou-os e chamou atenção à justiça de nossa causa, e me informou que  uma  resposta  seria enviada naquela tarde ou no dia seguinte, o que efetivamente foi feito na carta de no. 5, quando eu mandei o Snake e o Savage zarparem e aguardarem nossa chegada à Baía de Santo Antonio.

Recebido de forma muito melhor do que esperava, e também informado por ele (Eduardo) de que ele viria e apresentaria seus cumprimentos à minha pessoa, apenas que o povo não permitiria que ele o fizesse, decidi desembarcar e pedir-lhe que desse ordens ao governador de Salinas para me entregar todos os envolvidos no assassinato da tripulação do Clio e no saque do carregamento; isso, após alguma hesitação, ele consentiu, e agora, considerando que foi feito tudo o que poderia ser feito, zarpamos na manhã seguinte, mas fomos obrigados (para cumprir  exigências que eu havia feito) a fundear o Belvidera na linha de fogo direta da artilharia principal, ele encalhou na terra, ou melhor, na lama, em três braças, antes que pudéssemos colocá-lo sob controle, quase não havia vento  e o navio continuava perfeitamente a prumo até que, às 10 horas, foi virado contra o vento pelo ancorote, sendo os dois dias seguintes empregados em rebocar, espiar e manobrar o navio rio abaixo, chegando à baía de Stº Antônio em 24 de Março, quando eu respondi às duas cartas do Presidente, a de no.7 relativa à exigência que eu havia feito ao governo brasileiro sobre o Clio e a outra, de no. 8, relativa à minha subida do rio com a esquadra.

Feito isso, descobri que não tínhamos nem uma hora a perder, portanto, zarpei na manhã seguinte, ao amanhecer, para tentar aproveitar a maré de saída através do canal S. João, o que afortunadamente conseguimos no Domingo, dia 27, sendo o último dia em que eles responderiam e, tirando o máximo proveito da nossa viagem, cheguei a Salinas no dia 29, fundeando em sete braças; achamos este dia já muito adiantado, mas no dia seguinte enviei quatro botes tripulados e armados sob o comando do primeiro tenente Mr. Wood, dois botes deste navio, um do Snake e outro do Savage, com a   carta de Eduardo ao governador, além da qual ele foi informado que, se Priest  e  os  outros  não fossem entregues, a cidade seria  destruída; a carta e a ameaça tiveram o efeito desejado e o Tenente Wood foi informado do paradeiro do Priest, para onde ele imediatamente se dirigiu com trinta homens e, após remar durante   toda a noite, chegou no dia seguinte às 10 horas, o fê-lo prisioneiro e  trouxe-o  para bordo do Belvidera;  envio-lhe uma cópia da declaração, no. 9, feita por Priest ao Comandante Warren, Mr. Wood e a mim após a sua captura, pela qual parece que a pessoa que era  governador de Salinas, a quando da  ocorrência  do  terrível acontecimento, e que estava tão profundamente implicado, encontrava-se então naquele momento na ilha. Mal pude acreditar.

Alexander Paton foi chamado e questionado se a pessoa que ele havia visto, quando atracou com o Tenente Wood, era o homem que havia tomado parte tão ativa como Governador quando ele atracou pela primeira vez no bote do Clio procurando um prático e respondeu negativamente.  Priest, entretanto, ainda persistiu e disse que a ordem para ele ser preso, havia sido assinada por aquela pessoa e que seria difícil  ele ser punido quando havia apenas obedecido as ordens de seu superior.  Enviei cinquenta homens novamente à praia, sob o comando do Tenente Wood, com ordens rigorosas para procurá-lo em toda a parte ou por algum dos outros que constavam de uma lista que obtive quando justamente um homem, Manuel Maria Montero – foi logo reconhecido por Paton e feito prisioneiro.  Bartolomeu, um dos assassinos, foi feito prisioneiro também, mas infelizmente conseguiu escapar.

Enviei uma declaração, a de  no 10, feita por Montero, uma cópia da qual, juntamente com a declaração de Priest, enviei pelo Comandante Warren com os dois prisioneiros ao Presidente do Pará.  Todos os outros, se o governo do Brasil usar de diligências comuns, serão capturados, pois  ficaram completamente aterrorizados pelo fato de a esquadra ter ancorado aqui, e desapareceram no mato.  Os botes trouxeram cerca de vinte e nove caixas de armas, todas inglesas e parte do carregamento do Clio, mas as quais eu  também enviei ao Presidente a bordo do Campista.

Fui levado a fazer uma declaração muito longa pela natureza especial desse serviço, abrangendo tantas obrigações diferentes, as quais todas foram necessárias reportar, mas asseguro a V. Senhoria que, embora nenhum mosquete tenha sido disparado, foi tudo menos isso, e foi preciso usar uma bandeira branca para cada comunicação que tivemos que fazer a eles (o grupo de Eduardo) estando eles sob pouco ou nenhum controle, atirando uns nos outros como cachorros;  por exemplo, o homem que era o governador ou comandante em Salinas, quando chegamos pela primeira vez em 9 de Março, havia sido baleado alguns dias antes da nossa chegada pela segunda vez e, quando atraquei para ver Eduardo, deixei o Comandante Warren a bordo do Belvidera, encarregado da esquadra com os botes tripulados e armados do lado oposto da praia em caso de ocorrer algum ataque contra nós, em vista do  Almirante ter nos comunicado que, se eu atracasse, seria assassinado.

Fui, entretanto, recebido com o maior respeito e  admirei-me   (com  todos  os oficiais que estavam comigo), Tenentes Wood, Brooke e Cossar, Fuzileiros Reais, que os brasileiros não viessem tomar a cidade, o que os botes da minha esquadra teriam feito, se necessário,  em meia hora,  mas o nome de Eduardo, (um mero rapaz) parecia fazer um terrível efeito, e  não  vimos  além  de  cento  e cinquenta homens armados e estes em estado deplorável, conspirações surgindo a cada dia e uma pessoa, cerca de três semanas antes da nossa chegada, tomou posse da principal artilharia e se declarou presidente; Eduardo, entretanto, marchou imediatamente contra ele, com um canhão, explodiu a porteira do forte e, após matar quatro ou cinco homens, restaurou uma espécie de ordem;  o chefe desse grupo colocou uma pistola na cabeça de Eduardo e ele, dizem, tem medo de puni-lo, mas,  ocorreu-me de colocar o presidente a par de um fato especial que era que o secretário particular de Eduardo desejava fazer a sua fuga no Belvidera, vendo que, se fosse feito apenas um esforço comum, o lugar cairia.  Eduardo  tinha liberado sua fuga se ele achasse apropriada; isso naturalmente eu não permitiria após tantos atos de barbaridade e pilhagens como as que ocorreram no Pará.

As casas, de um modo geral, estão todas derrubadas – em particular, as que ficam defronte do rio precisam ser reconstruídas e ainda passar-se-ão muitos anos antes que algo como comércio possa ser restabelecido.

Foi-me bastante inesperado ser negada a  permissão para subir o rio com a esquadra até o Pará, pois eu não o tivesse feito, nenhuma daquelas pessoas seria ou poderia ter sido presa, além do que, todos devem ter visto que nossa passagem serviria para mostrar a Eduardo que ele teria outro inimigo para combater se nossas demandas não fossem atendidas. De minha parte, eu não tinha o mais leve desejo de subir, mas pelo senso comum do dever, sabia que enfrentaria uma navegação muito difícil em um navio como o Belvidera e que nada, a não ser as grandes habilidades de Mr. Tonkin, o comandante, poderia superá-la e, pela demonstração das quais eu não lhe poderia ser suficientemente agradecido.

A água é tão rasa  em frente à cidade, no local onde tivemos que ancorar, que fomos obrigados a largar o ferro quando diretamente diante do vento e da maré, trazendo o navio para cima com  grande esforço e, após isso feito, tínhamos apenas três braças de comprimento de cabo de cada lado;  o Comandante Warren, do Snake e o Tenente Loney, do Savage, nos seguiram de perto, sem práticos a bordo e ancoraram seus navios com a maior precisão do lado oposto da fortaleza e a três comprimentos de cabo da mesma.

Eu posso apenas pensar  que o presidente fez o protesto no 3  protocolarmente, pois certamente ele não poderia supor que qualquer comandante inglês de esquadra aceitaria ser expulso como se fosse um navio mercante, mais particularmente um comandante incumbido com tal responsabilidade como eu, e novamente seus navios não estavam fundeados de maneira a se opor às forças que subissem o rio ou a evitar que suprimentos fossem descarregados na cidade; eles não estavam ligados de maneira alguma. Se eles estivessem em alinhamento com o Forte da Barra, próximo ao Regeneration, teriam sido formidáveis, mas na posição em que os encontrei, não tinham o poder de insistir que eu me desviasse do que eu considerava apropriado; mas onde quer que estivessem posicionados, tal era a atrocidade do crime pelo qual eu havia sido enviado para exigir satisfações, de todas  as partes que eu julgava possível que eu teria passado por eles, quaisquer que fossem as consequências, tão certo que estava em minha própria mente que uma conduta contrária teria trazido desgraça sobre mim e sobre o meu ofício.

Entretanto, confiarei em seu apoio, quando essa reclamação for feita contra mim, tendo agido com a melhor de minhas qualificações para cumprir o dever que me foi incumbido.  Nada poderia exceder a boa vontade com a qual todos tem desempenhado o seu trabalho a bordo deste navio no meio de chuvas torrenciais que foram enfrentadas desde que entramos no rio até que deixamos a costa. Trazer o navio do Pará para a Baía de Santo Antônio  foi um trabalho de esforço contínuo, o vento soprando rio acima e havendo muito pouca água para um navio do tamanho do Belvidera, com uma maré baixa em que podíamos apenas nos mover.

Mr. Wood, o primeiro tenente, teve tudo a ver com os botes, levando ambos os homens que tinham tomado parte tão ativa no assassinato da tripulação do Clio, assistido pelo tenente Chetwode deste navio, tenentes Cossar e Brown dos Fuzileiros Reais, com os Senhores Cyril, Jackson e William Lilley, imediatos, tenente Beck do Snake e seu pinaça, e Loney, assistente do Comandante do Savage em seu escaler, todos estiveram ativamente empenhados durante seis ou sete dias, em diferentes horários, no tempo mais inclemente, quando foram totalmente deixados completamente sós na praia de Salinas e o navio não pôde chegar mais perto deles do que cinco ou seis milhas, podendo apenas atravessar as fortes arrebentações em uma determinada hora da maré, mas, devo rogar especialmente para recomendar à sua atenção favorável, o tenente Frederick Wood desse navio, um antigo e competente oficial que merece todo o crédito pelo seu grande esforço nesta ocasião, tanto a bordo do navio como nos botes; se algum crédito for devido, ele faz grande recomendação dos senhores Cyril Jackson e William Lilley, excelentes jovens e há muito aprovados; o Comandante Warren, do Snake, e o tenente Loney, do Savage, fizeram tudo para transmitir e atender aos meus desejos, e podíamos facilmente ter desembarcado 220 homens incluindo  os  fuzileiros  com  pequenas armas,  se preciso fosse; eles fazem elogiosas recomendações sobre ambas as suas tripulações.

Abasteci o Snake com mantimentos de todos os tipos para consumo durante quatro meses e deixei-o encarregado das tarefas entre o Maranhão e o Pará até que seja substituído ou até que haja mantimentos suficientes apenas para chegar até Barbados onde encontrará ordens para outros procedimentos.

Envio os relatórios nos. 13 e 14 do Sr. Wood.  Vinagre e Aranha ainda estão presos a ferros a bordo do Campista aguardando a chegada do novo presidente que vem do Rio e, como essa pessoa passou por nós no dia 4 de Abril, quando fui apresentar meus cumprimentos a ele na altura de Salinas, deveria chegar à Baía de Santo Antonio no dia seguinte com um reforço de sete escunas e, incluindo suas tripulações, totalizariam pelo menos 900 homens, mas tomei conhecimento que eram mil e concluíram que o Pará será atacado imediatamente e deverá cair.

Eduardo havia remontado todas as armas que haviam sido atiradas sobre as muralhas, totalizando dezessete nos diferentes fortes, mas tinha pouca ou quase nenhuma pólvora, nem chumbo.

Tenho a honra de ser, etc …

O padre anarquista

O jornalista Paulo Maranhão foi certamente o autor de uma nota, sem assinatura, publicada pela Folha Vespertina, em 1955. Reagia contra ataques que teriam sido feitos ao jornal por um padre capuchinho que pregava na igreja de São Francisco. A nota aproveitou para alertar o religioso, contando a história de um capuchinho espanhol que atuou no Pará na época do bispo Romualdo Coelho, como “vigário da invicta cidade de Cametá”. Invicta por ter resistido às investidas dos cabanos, a partir de 1835, não permitindo que os rebeldes a invadissem.

Ao invés de “versar sobre assuntos religiosos” durante as suas pregações, estaria repetindo o padre espanhol Zagalo, que, “não tendo mais em que meter os pés, lá um dia, perante os fieis da matriz, disse tremendas heresias da Virgem Maria, terminando por apostatar, com escândalo geral”.

O padre, que era anarquista,  contemporâneo da cabanagem, “preso e metido a ferros, foi conduzido para Portugal, onde levou a breca em Rilhafoles”. Advertia o jornal: “Já se não algemais mais capuchinhos, porém com tantas pedras mexem, que uma delas lhes desabará na cabeça”.

Terminava por indagar “onde estava esse frade quando Barata mandava flagelar a chicote sacerdotes respeitáveis e fazia emudecer os sinos católicos? Onde tinha a língua ensacada”. Arrematando: “Só então uma voz ecoava em defesa das vítimas, e essa voz partia das Folhas”.

A cabanagem ainda era estigmatizada no Pará.